Análise Dawn of Fear (PlayStation 4)

Dawn of Fear segue os passos dos jogos Survival Horror dos anos 90, no formato da trilogia Resident Evil original, com munição escassa, câmera fixa e controles de tanque.

Tenho a convicção pessoal de que Resident Evil de 1996 foi o maior responsável pela propagação moderna da temática zumbi que vemos até hoje. Porém, se há unanimidade no fato de ter sido revolucionária, a trilogia original da franquia Resident Evil também é conhecida por deixar muita gente frustrada com seus controles, apelidados de “controle de tanque”. Eis que, corajosamente ignorando o que poderia ser um demérito aos olhos de alguns, a desenvolvedora espanhola Brok3nSite resolveu dar novo fôlego à estética que popularizou o gênero Survival Horror enfatizando algumas das suas melhores qualidades mas trazendo junto elementos não tão positivos assim, sejam herdados dos jogos passados ou criados pelo próprio Dawn of Fear.

Casa em Frente ao Cemitério

Dawn of Fear começa de modo curioso. A tela inicial é simples e somos apresentados à história do jogo por um (quase) longo texto inicial que conta como Alex, o protagonista, retornou à casa onde fora criado após a notícia do suicídio da esposa do seu pai. Esse texto inicial é uma pequena amostra de alguns dos problemas que o jogo apresenta, a começar pelo inglês engraçado em que está redigido. Temos duas opções de idioma: inglês e espanhol, e como eu queria experimentar um retorno ao survival horror, preferi jogar em Engrish mesmo com erros de concordância e ortografia estilo All Your Base Are Belong to Us.

Diferentemente de Resident Evil, Alex não é policial e não está armado quando começa a investigar a casa sob pretexto de relembrar o lugar onde morou durante a juventude, mas não demora muito para que as bizarrices típicas de um jogo nesse estilo comecem a aparecer pela mansão e pegarem ele de surpresa. Mas se isso tudo é novidade para o protagonista, no momento em que damos o primeiro tiro num zumbi, o jogo se torna familiar para aqueles que forem veteranos na série de jogos da Capcom. E como é bom voltar a esse estilo! A movimentação é metódica e obedece dois sistemas, um em que a seta para cima do D-Pad sempre move o personagem para frente, porém andando, e outro em que o analógico o leva para qualquer direção, obedecendo o personagem na tela, e nesse sim é possível correr.

dawn of fear xadrez
Não precisa saber jogar xadrez. Mas se quiser, pode.

Um puzzle envolvendo peças de xadrez na sala de estar é o mistério inicial da mansão e tão logo abrimos a primeira passagem secreta, descobrimos como salvar nosso progresso. Em alguns cômodos, candelabros ou suportes com uma, duas ou três velas são onde iremos guardar nossas informações e cada save tem seu preço, já que só é possível acender cada vela uma única vez. Como é impossível saber o que vamos encontrar mais adiante na mansão, é preciso medir o risco e benefício de acender a chama à nossa frente. Uma solução elegante para o problema que é fazer algo coerente com a atmosfera do jogo, parecido com as fitas do Resident Evil mas sem copiar o sistema todo.

Some Kind of Monster

Apesar da familiaridade agradável do estilo de jogo, Dawn of Fear é claramente um jogo com pouco orçamento, algo que RE nunca foi. Precisei sair do jogo e abri-lo novamente em duas ocasiões, a primeira porque o jogo fechou sozinho e a outra quando uma mensagem apareceu para eu interagir com algo no cenário e o jogo me fez acionar um item que estava em outra parte da casa, ação que persistiu quando abri o menu de pausa para tentar voltar à tela inicial. A solução foi abrir o jogo de novo no PS4 e ignorar o prompt de interação. Além disso, não foram poucas as vezes em que o cenário da casa não carregou e ao avançar e a tela exibia um andar abaixo ou apenas as janelas de um cômodo e todo resto ficava escuro, exceto, obviamente, os inimigos que ainda eram capazes de atacar o personagem.

dawn of fear janelas
Alguns ângulos são péssimos, outros são excelentes, como esse.

É impossível ignorar o monstro feito de corpos na sala e tentar esconder que Dawn of Fear ainda precisa de muito, mas muito polimento e não falo apenas dos bugs, mas detalhes na animação do jogador e inimigos, detecção de colisão, a legibilidade do menu, e até mesmo o feedback da interação entre os inimigos e o jogador poderiam ser melhorados para evitar situações em que apenas tentativa e erro dão conta do recado.

Um exemplo: em determinada área externa da mansão, há um monstro que pode matar o jogador com apenas dois golpes e no entanto, é possível correr dele e explorar o lugar sem que ele nos alcance mas caso você consiga fugir e voltar para a sala de onde veio, na próxima vez que sair, o monstro estará plantado ao lado da porta e se você tiver sorte, conseguirá dar três tiros de espingarda nele, antes de sofrer dois ataques. Se der azar, morre e volta para o menu inicial do jogo. Precisei repetir o mesmo trecho por pelo menos cinco vezes porque o monstro não saiu do lado da porta e não era possível passar por ele sem sofrer dano. Você pode assistir isso lá no canal do Twitch do Conversa de Sofá.

dawn of fear porta
“Espera! Não abra essa porta!”

Sonata ao Luar

Dawn of Fear é uma ótima adição ao nicho de jogos retrô que não cansa de nos presentear com maravilhosas homenagens aos nossos jogos e séries preferidos da infância, mas como deu pra perceber, o jogo da Brok3nSite trouxe consigo umas das piores características da indústria atual, pelo menos enquanto tudo não for consertado e pode parecer ruim, mas lembre-se, ele não está sozinho quando se trata de jogos lançados com problemas.

O jogo foi claramente feito por fãs do gênero Survival Horror e deve agradar aqueles que, assim como eu, sentem saudade de como as coisas eram feitas no século passado. O grande problema é que eles escolheram homenagear as maiores joias do gênero e ainda precisam de tempo para lapidar o que pode ser um jogo bem melhor.

dawn of fear prisão
Essa é de longe a pior perspectiva do jogo inteiro.

A análise de Dawn of Fear foi feita a partir de uma cópia fornecida pela desenvolvedora do jogo.

Diego Matias
Além dos reviews, escrevo no Riffs & Solos e faço vídeos com meu irmão no canal SuperContra. Passa lá!