A primeira platina a gente nunca esquece

Pra tudo existe uma primeira vez na vida e o meu troféu de platina veio na hora certa, confira o relato de um jogador que ganhou uma Platina “sem querer” em Fallout 4.

Quando nos demos conta do que estava acontecendo, já era tarde demais.

Uma meia dúzia de decisões equivocadas tomadas pelo então presidente Michelzinho (ele insistia em usar o apelido de criança, embora já fosse mais velho do que eu era quando seu pai ocupou o mesmo cargo), colocou o país apoiando o aliado errado em uma guerra tão inevitável quanto injustificada.

Aos poucos, já pagando o preço pelas más escolhas do presidente, o Brasil sofria uma gradativa destruição dos poucos recursos vitais que ainda nos restavam e da infraestrutura que permitia o funcionamento do país.

Sobrou apenas a energia elétrica, recurso obsoleto, que não era capaz de fazer os equipamentos atuais funcionarem, ainda que minimamente.

Assim, aos poucos as pessoas eram desconectadas da realidade e obrigatoriamente voltavam a experimentar o que chamavam, pejorativamente, de Vida 1.0.

Lembro que nesse momento, agradeci por nunca ter aderido à moda de implantes externos. Embora eu não imaginasse que pudesse acontecer, não conseguia olhar sem rir por dentro das pessoas com add-ons, agora completamente inúteis.

Quando a “Vida 1.0″ voltou a ser a realidade, vivemos momentos de tensão: quem era de chorar, chorou como nunca; quem era de brigar, disseminou a violência até quase destruir o pouco que restou; quem era calmo, observou o Apocalipse, que muitos até diziam desejar, mas para qual ninguém de fato estava preparado.

Quando percebi, o tempo não era mais escasso.

A rotina de quase todos os dias era vasculhar escombros atrás de objetos de valor que pudessem ser trocados por algo de interesse (todo mundo pareceu um pouco cansado supervalorizar objetos, então a troca sempre era o mais próximo do que se pode chamar de justa), mas o tempo ocioso era comum à todas as pessoas.

Alguns detestavam, outros adoravam. Particularmente, em todos esses anos eu nunca deixei de apreciar a fina arte de fazer nada.

Imagem meramente ilustrativa
Imagem meramente ilustrativa

Tudo corria dessa forma. Eu que já não era nenhum garoto, esperava a morte chegar (com direito à uma boca cheia de dentes), de forma serena, em paz. Mas a Vida 1.0, que sempre foi uma caixinha de surpresas no passado, não seria diferente nesse presente distópico não é mesmo?

Passando em frente ao que parecia ser um antigo shopping center (agora completamente vazio), encontro um exemplar de uma tecnologia tão obsoleta quanto eu. Mal dava pra discernir qualquer escrito na caixa, apenas em uma pequena porção não coberta por camadas de sujeira, se podia ler, sobre um fundo branco: 500GB. Eu reconheceria aquele formato de caixa em qualquer lugar.

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Voltei para o abrigo, liguei a televisão velha e apreciei cada segundo do momento em que abri a caixa (existe sensação melhor?). Pra minha surpresa, um bundle de PlayStation 4 com a segunda reedição de Fallout 4 (confesso que sofri um pouco no começo, pois os gráficos não chegavam nem perto da “Edição Realidade”).

Então eu joguei, por um dia inteiro. E outro. E mais um. E quando eu percebi, um game que antes era um pouco impossível de terminar, pela falta de tempo, já não durava 3 tardes.

Perdi a conta de quantas vezes terminei Fallout 4 naquele ano, algo que seria completamente impossível de eu fazer, já que faltava tempo e sobravam jogos. Veja bem: cada vez que eu rejogava algo que eu já tinha zerado, estava perdendo a oportunidade de jogar um game novo. Mas isso não era mais um problema!

Até que um dia, depois de jogar por meses a fio e completamente entediado, me aconteceu algo inédito: conquistei um troféu de platina! O primeiro da minha vida!

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Foi um sentimento único!

Algo que eu jamais havia experimentado! Conquistei tudo que havia para conquistar em Fallout 4 e sentia como se eu fosse o melhor jogador de games do mundo todo (e talvez fosse mesmo, considerando as circunstâncias).

Contudo, toda a excitação pela minha primeira platina já não estava mais lá, após cinco minutos. Aquela experiência que parecia incrível, havia se esvaziado por completo. Não sobrou nada. Nem sequer a vontade de retornar à Wasteland virtual, como nos velhos temos.

Mas ainda assim, aquele foi o melhor dia desde o início da guerra. Embora toda a emoção da platina tivesse ido embora, uma ótima novidade surgiu no céu: o brilho fascinante de um gigantesco meteoro.

Vem, meteoro!
Vem, meteoro!

O mundo estava acabando. Só senti falta do velho Twitter pra comemorar as duas alegrias.

Tiago Matias Escobar
Metaleiro não uniformizado. Cerveja, pizza, games e viagens ocasionais.